Pausa e Respiro

Por que fugimos de sentir? O custo emocional de anestesiar a dor

A herança do “engole o choro”

Quantas vezes corremos para o celular, abrimos a geladeira, pedimos um delivery, ligamos uma série ou enchemos a agenda de compromissos para evitar sentir algo que insiste em aparecer?
Fomos ensinados a reprimir o que dói. Sempre dizem que “vai passar”. Mas é necessário aprender a discernir a dor que leva ao drama que não sai do lugar daquela dor que precisa ser ouvida para não piorar.

Todos somos herdeiros do “engole o choro”, e isso tem uma explicação ancestral. Uma das sensações que a tristeza provoca é a baixa de energia. Quando estamos tristes, ficamos sem vontade de fazer até mesmo o que gostamos. Muitas vezes confundimos tristeza com cansaço, tamanha é a exaustão que ela traz ao corpo.

Lá atrás, nos tempos das cavernas, se alguém permanecesse triste, encolhido em seu canto, correria sérios riscos: não teria energia para coletar alimentos ou fugir de predadores. A tristeza, portanto, representava ameaça à sobrevivência da espécie. Assim, aprendemos a reprimir o sentir como mecanismo de defesa.

Hoje, porém, a tristeza não nos ameaça da mesma forma. Mas o cérebro ainda guarda esse modo primitivo de funcionamento, e muitas vezes seguimos suas “recomendações” como se ainda precisássemos sobreviver.

É hora de atualizar nossa mente, corpo e emoções, reconhecendo que agora estamos em um lugar seguro e capazes de lidar com o que sentimos.

Nossos mecanismos de fuga

É importante lembrar que existem situações agravadas de adoecimento que exigem acompanhamento médico, psicológico e mudanças no estilo de vida. Mas compreender a origem desse comportamento ajuda a acolher nossa natureza e iniciar mudanças.

Quando não queremos sentir, buscamos atalhos:

  • Redes sociais: rolar a tela sem fim para não encarar o que lateja por dentro.
  • Comida: preencher o estômago para não lidar com o vazio emocional.
  • Compras: a euforia do instante que mascara a tristeza.
  • Trabalho excessivo: estar ocupado para não ter tempo de sentir.

O problema é que, ao fugir, não damos nome, não elaboramos, não transformamos. A dor retorna, muitas vezes mais intensa. O corpo começa a somatizar: dores de cabeça, taquicardia, ansiedade, insônia. E bloqueando a tristeza, também bloqueamos a alegria, a criatividade, a vitalidade e o prazer de viver em equilíbrio.

Existe saída? Sim.

Fugir pode até aliviar por um instante, e é natural recorrer a isso de vez em quando. Mas não podemos normalizar essa prática. Sentir é o único caminho para curar.

Três passos simples podem ajudar:

  1. Dar nome ao que se sente: escrever, falar, reconhecer.
  2. Pausar e respirar: pequenos intervalos de presença para se reconectar.
  3. Buscar apoio seguro: terapia, grupos de escuta, vínculos que acolhem sem julgar.

Quando paramos de anestesiar a dor, descobrimos que ela não é inimiga, mas mensageira de algo novo que precisa nascer em nós.

Sobre a autora

Iana M. Diniz é psicóloga e autora do livro “Quantas vezes você já tentou mudar esse ano?”.
Na obra, ela aprofunda reflexões sobre como sentir a tristeza sem ser engolido por ela pode abrir caminho para mudanças efetivas e duradouras na vida.

Psicóloga, escritora e professora, convida a pequenas pausas com grandes sentidos para nutrir o bem-estar e cultivar equilíbrio emocional.

Um comentário

  • Sandra Lima

    Texto maravilhoso!
    O final deu uma luz….!! a dor é uma mensageira, verdade, e com certeza ela abre caminhos para resolver essas questões tão profundas e nos levar a mudanças mesmo!!
    Perfeita reflexão 🙏🏻

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